sábado, 24 de março de 2012

HISTÓRIAS DE PROFESSORES...


Se existe gente que tem história para contar são os professores. E são passagens das mais pitorescas - umas cheias de cores, beleza e alegria e outras com pontos obscuros e tristes - mas sempre há o que se contar porque em sala de aula acontece de tudo.

O estado de São Paulo lançou há muito tempo atrás um livro que trazia muitas histórias de sala de aula que nos transmitiam verdadeiras lições de vida.

A vida é mesmo assim - ensina por paradigmas, uns bons e outros não tão bons assim... aquela coisa - EU TAMBÉM PASSEI OU POSSO PASSAR POR ISSO...

Assim fez Gabriel Chalita, há um tempinho atrás lançou um livro: HISTÓRIAS DE PROFESSOR QUE NINGUÉM CONTOU.

Sua forma de organizar esta obra foi muito parecida com o livro do Rubem Alves - FESTA DE MARIA - Alves fez analogias e utilizou-se de metáforas entre as emoções e a comida, já Chalita fez uso de expressões do latim, para explanar sobre fatos que ocorrem na educação.

Muito felizes e sensíveis suas abordagens, mostrando que a EDUCAÇÃO é cheia de possibilidades e que para EDUCAR é preciso uma alma receptíva e aberta, e que o trabalho é, quase sempre, ÁRDUO.

Não sou tão fã assim deste homem que no fim de tudo tornou-se mais político do que EDUCADOR, mas com certeza ele possui seus méritos e qualidades, afinal todos possuem um caráter dotado de dicotomias.

Deixo aqui a sugestão de leitura e excertos do livro que muito me tocou...

" Algumas pessoas olham pela janela e vêem as rosas murchas e ficam tristes.
Outras pessoas olham pela janela, vêem as roas murchas e ficam felizes... são capazes de ver a semente."

" É preciso ser especial para entender o que significa educar na heterogeneidade. Na verdade, todos os alunos são sempre especiais e todos são carentes de afeto, de atenção, de amor."

" Educar é possibilitar ao outro as condições necessárias à transcendência, à superação de suas limitações, à concretização dos seus ideais, à realização dos sonhos. Educar é criar impulsionar e capacitar para a vida. É conceder ao outro a aquisição de saberes essenciais a uma existência digna e promissora.
Das primitivas e milenares histórias de amor aos grandes sucessos tecnológicos do novo milênio, sempre há a figura do professor. São fundamentais essas criaturas, e não importa se ganham a fama e o reconhecimento geral ou se permanecem no anonimato da vida nos rincões afastados , todas praticam a saudável premissa de acreditar na semeadura e na colheita.
[...] Se há no mundo alguns magoados que vivem de lamúrias, que reclamam a cada novo amanhecer porque nem tem olhos para contemplá-lo... se há no mundo alguns magoados que vivem de queixumes clamando contra tudo e todos - há no mundo inquietos, pessoas que acreditam na própria luz e que iluminam. Trabalham, rompem os obstáculos e se lançam no horizonte que podem construir."

Espero que gostem da sugestão de leitura!

EDUCAR É PRECISO!!!! Sim, antes de mais nada EDUCAR a nós para depois EDUCAR o outro.

Abraços a todos.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Razões para tirar um filho de uma escola Waldorf – Parte 1

vestibular Penso que os argumentos contra um aluno fazer o ensino médio em uma escola Waldorf sejam os seguintes:

- As escolas Waldorf não preparam para os exames vestibulares.

- As escolas Waldorf dão mais ênfase a matérias não científicas.

- As escolas Waldorf não preparam os alunos para enfrentar o mercado de trabalho.

- As escolas Waldorf apresentam um ambiente irreal.

Exame dos argumentos

1) A questão dos exames vestibulares

A primeira consideração que se deve fazer é que esses exames são uma realidade, mas são absurdos. Depois de ter experiência de ensino universitário na USP desde 1964 considero que o resultado do vestibular não tem quase nada a ver com o desempenho do aluno na faculdade. Em outras palavras, passar um vestibular não é garantia de que o jovem será um bom aluno na universidade. Pior, não é em absoluto garantia de que ele será posteriormente um bom profissional. A única coisa que um vestibular garante é que o jovem que o passou sabia responder as perguntas específicas daquele exame melhor do que outros jovens. É praticamente garantido que, passados alguns meses sem a continuidade do preparo para o exame, o desempenho será totalmente diferente, isto é, muito pior. Também é praticamente garantido que os professores universitários não passariam um vestibular concorrido sem que se preparassem para ele. Em outras palavras, o conhecimento necessário para passar um vestibular é momentâneo e não tem quase nada a ver com a vida acadêmica e profissional posterior.

Se uma escola é especializada em preparar para vestibulares específicos, ela se torna também um absurdo. O que o jovem deve ter é uma formação geral, e não uma formação específica. Mas formação geral significa o desenvolvimento global em conhecimento, em maturidade e em capacidade em três áreas absolutamente fundamentais: as áreas intelectual, artística/artesanal e social. Para os exames vestibulares, apenas o desenvolvimento intelectual é essencial; com um bom desenvolvimento nessa área, um semestre ou dois de cursinho preparatório razoável colocam dentro de qualquer faculdade qualquer aluno com capacidade de estudo.

Por que as outras duas áreas, a artística/artesanal e a social são essenciais? Acontece que o ser humano não é só intelecto. A atividade artística está relacionada com dois aspectos fundamentais: a sensibilidade artística, isto é, para com o belo, e a capacidade criativa. Criatividade é baseada em fantasia, isto é, ter novas ideias, e na capacidade de concretizá-las no mundo real. Ora, fantasia tem que ser desenvolvida e exercida em um ambiente mal definido, como é justamente o ambiente sobre o qual se exerce qualquer atividade artística, contrariamente ao ambiente científico ou intelectual apresentado aos alunos nesse nível. Em geral, os professores de ciências tendem a passar uma imagem de conhecimento absoluto da ciência. Por exemplo, pergunto aos meus leitores: quantos de vocês aprenderam no ensino médio que um átomo não é um sistema planetário, com os elétrons girando em torno do núcleo? Como eles têm carga elétrica, a aceleração para mudarem de direção produziria irradiação eletromagnética, com isso eles iriam perder energia e deveriam cair no núcleo em um movimento espiral. Gostaria imensamente de conhecer pessoas cujos professores lhes tivessem ensinado, no ensino médio, que não se sabe o que é um elétron e nem um átomo. Essa imagem de conhecimento absoluto da ciência é extremamente prejudicial, apassivadora (tudo o que o professor diz na aula é transmitido e absorvido como verdade), e produz um intelecto rígido.

Compare-se o tipo de conhecimento intelectual (também usado em outras áreas, como a história, se é que ela é ensinada, se não é pedida no vestibular), com o de uma arte como o teatro. Dado um texto teatral, ele pode ser interpretado com entonações de voz e com gestos de infinitas maneiras diferentes, o que é denominado de ‘subtexto’, pois não consta explicitamente do texto. Na atuação numa peça teatral nada é rígido, tudo tem que ser imaginado e interpretado. Essa imaginação e essa liberdade simplesmente não existem no aprendizado de matérias intelectuais onde, seguindo os passos da ciência, procura-se formalizar tudo. Com isso, cria-se um modelo da natureza simplificado e, portanto, absolutamente irreal, pois a realidade é extremamente complexa. Toda ciência, ao ser expressa conceitualmente, tem que necessariamente simplificar a realidade, isto é, afastar-se dela. Pode ser que o ensino universitário também seja mentalmente castrador, e não dê margem para a criatividade, o que é muito comum. No entanto, o que é importante na posterior vida profissional é justamente a criatividade, precisamente aquilo que a atividade artística desenvolve. Uma outra consequência da atividade artística é que a sensibilidade assim desenvolvida leva a uma sensibilidade social pois, como nas artes, o ser humano também é mal definido e imprevisível.

Ter sensibilidade social significa perceber as necessidades e capacidades das pessoas e conseguir dirigir-se a cada uma individualmente segundo as suas características. A habilidade de atuar em equipe e de liderar, e até mesmo o convívio social depende totalmente dessa sensibilidade. Mas há outra característica social fundamental: a compaixão, isto é, a capacidade de compartilhar o sofrimento do outro. Infelizmente, há dois fatores que produzem uma trágica dessensibilização, impedindo a manifestação da compaixão: a competição e os meios eletrônicos. Competição é absolutamente antissocial: quem ganha fica contente, às custas da frustração e mesmo infelicidade de quem perde. Produzir essa frustração e ficar contente em ter ganho a competição significa dar mais valor à felicidade pessoal do que ao sofrimento do outro. Quem compete não pode ter dó do concorrente. Assim, a competição desenvolve o egoísmo, que é altamente antissocial. O próprio vestibular é uma competição, e seria muito bom que o jovem se conscientizasse o mais tarde possível de que a sociedade é cruel e competitiva. A propósito, a própria vida vai ensinar a competir: não há, em absoluto, necessidade de se ensinar isso na escola, pelo contrário, o que precisamos é o ensino da cooperação. Somente uma sociedade cooperativa poderá reverter a crescente miséria social e individual, fruto do egoísmo e da ambição.

Howard Gardner (Gardner 1995) e Daniel Goleman (1995) mostraram muito bem que a mais importante habilidade para o sucesso profissional não é a técnica, e sim a social. Em particular, Gardner chama a atenção para o fato de as escolas desenvolverem principalmente o que ele denominou de "inteligências lógico-matemática e linguística", as quais ele caracteriza como as menos importantes para um sucesso profissional. A "inteligência emocional" de Goleman (correspondendo à "interpessoal" de Gardner) nada mais é do que o conjunto das habilidades sociais.

Quanto aos meios eletrônicos, a TV e os jogos eletrônicos transmitem uma quantidade enorme de ações antissociais, como por exemplo a violência, sendo que os segundos são muito piores do que a primeira, pois neles não existe condicionamento apenas pela imagem e pelo som, mas também pela ação executada pelo jogador (os jogos mais apreciados, principalmente pelos jovens, são os do tipo ‘mata-mata’). A escola deveria ter hoje em dia uma missão fundamental, muitíssimo mais importante do que o conhecimento teórico que é transmitido: justamente contrabalançar essa dessensibilização fazendo com que os jovens adquiram sensibilidade social e compaixão.

As escolas Waldorf não preparam para os exames vestibulares. Ainda bem! Assim elas podem dar uma formação ampla, intelectual, artística e social, produzindo jovens equilibrados e não pernetas com uma só perna intelectual. No entanto, como mostra tão bem o levantamento estatístico feito por Wanda Ribeiro e Juan Pablo de J. Pereira (Ribeiro, 2007), os alunos Waldorf não têm dificuldades em passar nos vestibulares; certamente os mais concorridos exigirão um semestre ou um ano de cursinho, mas o tipo de ensino daquelas escolas produz um tal desenvolvimento intelectual e uma tal capacidade de concentração e firmeza de objetivos que facilita enormemente o aprendizado compacto do cursinho. O estudo citado mostra também várias características interessantes dos ex-alunos Waldorf. Um outro trabalho nesse sentido é o de Douglas Gerwin e David Mitchell (Gerwin 2007), sobre ex-alunos Waldorf nos EUA. Todos os levantamentos feitos com ex-alunos Waldorf mostram vidas acadêmicas e profissionais posteriores muito boas, praticamente sem problemas de adaptação.

Alguns pais poderiam dizer: "Mas eu não quero que meu filho perca um ano de cursinho!" Acontece que não há nenhuma vantagem em entrar cedo numa faculdade. Pelo contrário, um ou dois anos de espera significarão uma enorme maturidade nos objetivos e na capacidade de estudo. Infelizmente nosso ensino universitário é excessivamente especializado profissionalmente; o ideal seria que todas as universidades tivessem um ou dois anos de ensino básico, e que os alunos pudessem escolher sua especialização profissional quando estivessem mais maduros.

O preparo para um vestibular concorrido significa um esgotamento mental. Se isso for feito durante todo o ensino médio, o aluno entrará na faculdade intelectualmente exausto. Quanto menos ele tiver que se preparar para essa experiência traumatizante, melhor.

Uma pergunta muito interessante é a seguinte: se as escolas Waldorf são independentes, cada uma adotando suas próprias características, por que nenhuma das inúmeras brasileiras (ver o diretório de escolas Waldorf já citado) prepara para o vestibular? Na Alemanha, por exemplo, não há um exame assim, mas há um exame de estado parecido com o ENEM, mas muito mais amplo, e cujo resultado é usado pelas faculdades para selecionar seus alunos, o ‘Abitur’. Pois bem, as escolas Waldorf alemãs terminam o ensino médio, na 12a série, e oferecem um 13o preparatório para o Abitur. Assim, elas podem concluir na 12a série o grandioso currículo introduzido por Rudolf Steiner, que visa o desenvolvimento harmônico do jovem em todos os sentidos. As escolas Waldorf não preparam para o vestibular, pois isso tomaria quase todo o tempo de ensino e do aluno, e seria introduzir uma unilateralidade extremamente prejudicial à formação harmônica dos jovens, produzindo pernetas intelectuais, cabeças ambulantes com pouco ou nenhum coração e sem força de vontade para a ação. Mas não sou contra as escolas Waldorf, por iniciativa dos pais, e administrado essencialmente por estes, introduzirem um cursinho dentro da escola, a ser frequentado pelos alunos formados que querem se preparar para um vestibular. A grande vantagem disso seria, por exemplo, equilibrar um pouco o necessário ensino exclusivamente intelectual, com algumas atividades artísticas. Além disso, poder-se-ia dar ao jovem um ano a mais de um ambiente social sadio.

Valdemar W. Setzer

No próximo post virá o exame do argumento seguinte.

Fonte: http://www.ime.usp.br/~vwsetzer/tirar-de-waldorf.html

Imagem: pedrovaladares.wordpress.com